Entrevista com Nilde Soares, a idealizadora do Blog Distonia Saúde

Um dos parceiros do Blog Dyskinesis na causa das pessoas com distúrbios de movimento é o Blog Distonia Saúde. Sua criadora é a Maria Nilde de Oliveira Soares, moradora de São Paulo e que possui distonia cervical. Nesta entrevista, ela conta um pouco de sua história de vida e das motivações que a levaram a idealizar o Distonia Saúde, que é hoje uma das principais fontes de informações on-line sobre distonia em português.

Nilde controla rigorosamente as datas de aplicação de toxina botulínica, e nesta foto ela estava há 91 dias sem o produto.

Blog Dyskinesis: Nilde, onde você nasceu e como foi sua infância e adolescência?

Nilde Soares: Nasci numa tribo indígena que ficava próxima de uma cidade de nome Gurupi, no estado do Maranhão. Minha infância foi em um convento que, na época, era bem rigoroso, tínhamos horário para tudo. Já na adolescência, “queimava chão” (assim dizia a Madre Superiora, rsrs), fiz tudo que devia e não devia. Fugi do convento e vim ser feliz em São Paulo…

Blog Dyskinesis: Como era sua profissão e sua vida no trabalho antes de você desenvolver a distonia?

Nilde Soares: Sempre gostei de gente e, sendo assim, trabalhei na área de vendas no segmento corporativo. Sempre lidei com pessoa jurídica (empresas), e foi assim que tudo começou, porque meu sonho era trabalhar em uma determinada empresa de software e, quando consegui, pirei de alegria, mas as cobranças que vieram com o trabalho eram muitas e isso foi me minando. Minha ex-chefe não era uma boa gestora, era extremamente rigorosa. Bastava ela chamar meu nome e eu até pulava da cadeira, vivia sobressaltada. Quando tínhamos as famosas reuniões de metas e estratégia de vendas, ela saía dizendo o que devia e o que ela achava que devia (exemplo: eu espancava minhas metas e ela simplesmente dizia “não sei por que esta alegria toda, você só fez a sua obrigação”). Eu sempre fui uma pessoa de expor minha opinião, coisa que evitava fazer, pois, se fizesse, seria mandada embora na mesma hora, então eu andava com uma garrafinha d’água debaixo do braço, como forma de me controlar eu ia tomando pequenos goles de água. Ao ouvir ou ao responder algo, eu literalmente tinha que engolir “a seco”. Eu sentia que ela não gostava de mim, me tratava diferente. Neste período, eu já estava fazendo visitas semanais aos prontos socorros da vida, e a frequência disso só aumentava.

Blog Dyskinesis: Como foi este período para você? O que os médicos diziam?

Nilde Soares: Em 2012, enquanto ainda trabalhava, passei a ter ansiedade, fobia social, sudorese, mudanças de humor, insônia e dores de cabeça. Fui em busca de ajuda e, obviamente, fui ao psicólogo e psiquiatra me diagnosticaram com TAG (transtorno de ansiedade generalizada), fiz tratamento medicamentoso com psiquiatra (até então, eu não percebia ainda meus movimentos involuntários e achava que era algo psicológico), tinha dificuldades para dormir porque me sentia inquieta, não conseguia ficar parada, não consegue “desligar”. Fui a todos os médicos possíveis, passei com muitos neurologistas e ninguém sabia o que eu tinha.

Blog Dyskinesis: Quando e como veio finalmente o diagnóstico? Como você se sentiu?

Nilde Soares: Quem desconfiou primeiramente que eu tinha distonia foi a minha cunhada, Patrícia Alves. Eu fazia os tratamentos anteriores e achava que estava surtindo efeito, mas minha cunhada passou um tempinho sem me ver e, quando ela me viu novamente, ela disse: “Você não está melhorando, seu pescoço está esquisito e você está fazendo umas coisas engraçadas com sua face”. Ela precisou insistir um pouco mais que uma vez para que eu e meu marido aceitássemos ir atrás de mais informação sobre a tal doença da qual ela estava falando. Então, tive o diagnostico em 2016 com o Dr. Rodrigo Massaud. Eu fiquei feliz, por finalmente descobrir o que eu tinha, mas também fiquei triste, entrei em depressão, foi terrível… Chorei e me perguntei o porquê, “por que comigo?”. Acho que todo mundo se faz estas perguntas uma hora ou outra, né, rsrs.

Nilde marcando presença na manifestação de maio de 2016 .

Blog Dyskinesis: Como surgiram as primeiras ideias para a criação do Blog Distonia Saúde?

Nilde Soares: Após passar pelas dificuldades relatadas acima, me levantei e disse “Então tá! Vamos à luta!”. Baseada em toda essa falta de informação pela qual passei até ter finalmente o diagnóstico correto, decidi elaborar o projeto do Distonia Saúde. Eu estava insegura, achava que era a única no mundo que deveria ter a tal da Distonia. E aí conheci um dos meus médicos, o Dr. Sidney Gomes, neurologista do Hospital Beneficência Portuguesa, e ele me disse que me ajudaria com o projeto. No Facebook, meu marido descobriu que haveria um encontro de pessoas com distonia na Avenida Paulista em maio de 2016. Eu fui e conheci a Elizabete Tavares, e isso só fez com que eu tivesse certeza de querer colocar meu projeto em ação. Depois, fui em um seminário de nome Blogueiros da Saúde e conheci o SEO Anderson Ferro, que conseguiu tirar as ideias da minha cabeça, desenvolveu minha logomarca, meu aplicativo e colocou tudo em prática. Há menos de sete meses, conheci também a Dra. Vanessa M. Holanda, neurocirurgiã que abraçou nossa causa, igualmente.

Blog Dyskinesis: Então, nasceu o Blog Distonia Saúde. Qual é o objetivo dele?

Nilde Soares: O objetivo do Distonia Saúde não é comercial. Quando digo comercial, estou me referindo a indicar produtos médicos ou os próprios médicos. O objetivo não é indicar serviços da área de saúde, ou indicar tratamentos ou cirurgias. O blog surgiu com a missão de facilitar o encontro entre pacientes e médicos. Pois, venhamos e convenhamos, nós distônicos sabemos da dificuldade que é achar um neurologista sub-especializado na nossa doença. É difícil e desgastante, já que o médico neurologista não precisa só conhecer sobre distúrbios de movimento, mas também a Distonia e suas variáveis. O primeiro problema de quem tem Distonia é ter o diagnostico correto. O segundo é iniciar o tratamento. Muitos de nós, distônicos, também não temos condições de arcar com o tratamento. Além disso, encontramos dificuldades para comprovar nossa deficiência perante o INSS e outros órgãos públicos, apesar de sermos cerca de 65 mil brasileiros com Distonia (dado obtido do próprio site da ABN). Eu mesma passei por duas vezes no INSS e fui indeferida nas duas vezes. Me pergunto: “Como que um perito sequer sabe o que é Distonia?”. Quando eu questionei o primeiro perito, ele simplesmente disse: “sua doença, se é que é doença, não é limitante”. Eu parei, respirei fundo e resolvi fazer algo. Recorri da decisão dele. E pela segunda vez fui indeferida. Mesmo eu, na segunda perícia, me abstendo de fazer meu bloqueio neuromuscular (aplicação da Toxina Botulínica) para que o perito visse como fica um ser humano em crise de Distonia. E, acreditem, ainda assim eu fui indeferida. É isso, a batalha vai ser árdua daqui para a frente.

Blog Dyskinesis: Quais dificuldades você já enfrentou durante a criação do seu blog?

Nilde Soares: É difícil ter noticias com credibilidade, é difícil receber muitas portas na cara, não ser acreditada por quase ninguém… Tenho cinco pessoas importantes, pessoas estas que me incentivaram no projeto. O primeiro foi meu marido e patrocinador Jorge Alves, depois o Dr. Sidney Gomes, o SEO Anderson Ferro e agora contamos também com o apoio da Dra. Vanessa Holanda, da Dra. Sara Casagrande.

Blog Dyskinesis: O Blog Distonia Saúde possui também um Guia Médico para facilitar a busca por profissionais especializados na área. Como isto funciona?

Nilde Soares: É importante comentar que estamos sempre atualizando a relação dos médicos cadastrados no nosso banco de dados, pois todos são sub-especializados em Distonia. Inicialmente, a relação destes médicos foi fornecida para o blog através do nosso patrono, o médico neurologista Dr. Sidney Gomes – CRMSP 77682 / CRMMG 13057, membro da Academia Brasileira de Neurologia (ABN), da Sociedade Brasileira de Clínica Médica, da Academia de Medicina Militar e da Sociedade Europeia de Neurologia. Com o passar do tempo, estamos adicionando outros profissionais que não vieram através da ABN, mas sim através do próprio blog e divulgações nas nossas redes sociais. Vale ressaltar que, independentemente de disponibilizarmos esta relação de médicos no blog, isto não constitui e não implica em uma recomendação ou endosso do profissional pelo nosso blog.

Nilde e seu marido Jorge.

Blog Dyskinesis: E como está sua vida hoje, Nilde?

Nilde Soares: Hoje, sinto-me bem e sou amparada por toda minha família. Ter distonia cervical não é fácil, mas lido bem com ela… Driblo alguns sintomas, aprendi a conhecer meu corpo, aprendi a sentir quando a “tempestade distônica” está vindo e, nessas horas, me poupo física e mentalmente. Busco equilíbrio nos meus dois amores: meu marido Jorginho e meu cachorro Bob (meu filho de 4 patas). E tenho a certeza de que estou sendo assistida por duas boas profissionais da área. Isso me acalma, pois eu também tenho o Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG) e, o fato de saber que minha equipe está logo ali, me dá forças e foco para seguir em frente.

 

* Crédito das fotografias: arquivo pessoal da entrevistada.

 

Entrevista realizada por Ana Raquel Périco Mangili.

6 comentários

  1. Pingback: Distonia Saúde: Entrevista ao blog Dyskinesis

  2. Pingback: Retrospectiva 2018 do Dyskinesis | Dyskinesis

  3. Meu nome é Adriano Lopes, fui diagnosticado com distonia em abril deste ano (2019) pelo meu neurologista Dr. Julio, que me encaminhou para sua colega especialista no distúrbio do movimento Dra. Vanessa M. Holanda.
    Cheguei em seu consultório desesperado e muito preocupado com minha situação, pois estava afastado do trabalho e em crise de depressão. Tinha vergonha de sair de casa, pois todos ficavam olhando para mim com um ponto de interrogação no rosto.
    No último dia 06/08 fiz minha primeira aplicação de botox com as dras. Sara e Vanessa.
    Houve um grande alívio nas contratações involuntárias. Sigo confiante no tratamento e confio primeiramente em Deus e nas doutoras que me acompanham.
    Conheci a Sra. Nilde Soares no dia da aplicação e desejo sinceros votos de melhoras.
    PS.: Fui bem assistido pela previdência social que deferiu já na primeira perícia.

    Curtido por 1 pessoa

  4. Pingback: Como as pessoas com distúrbios do movimento estão lidando com a pandemia? | Dyskinesis

Comentários